terça-feira, 20 de junho de 2017

O Sagrado Coração e o Santíssimo Sacramento

Se tivéssemos uma fé mais viva, nós o veríamos presente no altar em meio ao sagrado peito de Jesus, e, então, quantas graças esta fé viva atrairia sobre nossas almas!


Mons. De Ségur (*) | Tradução Sensus fidei: O Sagrado Coração de Jesus reside entre nós na terra, enquanto, ao mesmo tempo, no céu. Inseparável da santíssima e adorabilíssima humanidade de Jesus Cristo, da qual é como o centro e a vida, este divino Coração, tão amante e tão amado, reside em cada uma de nossas igrejas sob os véus eucarísticos, como é de fé.
Frequentemente esquecemos a realidade desta viva presença de Nosso Senhor na terra. Em teoria todos nós cremos nela (do contrário, seríamos hereges), mas não todos na prática; e esta é talvez a causa principal dessa tibieza, dessas mil e mil faltas que somos os primeiros a lamentar. Não temos, ao menos na medida que seria necessário, o espírito de fé na presença real de Nosso Senhor Jesus Cristo na Eucaristia.
O mesmo sucede relativamente com o seu Sagrado Coração. Nós olhamos muitas vezes como uma espécie de abstração celestial, belíssima contemplada de longe, mas inacessível. Se tivéssemos uma fé mais viva, nós o veríamos presente no altar em meio ao sagrado peito de Jesus, e, então, quantas graças esta fé viva atrairia sobre nossas almas!
Do fundo de seu tabernáculo Jesus Cristo nos aguarda, chama-nos: como à beata Margarida Maria, mostra-nos e às vezes nos abre o seu Coração abrasado de amor: “Olhai, diz-nos, vede aqui o Coração que tanto tem amado os homens, e como reconhecimento pelo meu amor deles não recebo senão ingratidões, irreverências e ultrajes!” O altar é, com efeito, o trono do divino amor, como o tribunal da Penitência é o trono da divina misericórdia. Do alto deste o Coração de Jesus se entreabre para perdoar e purificar: do alto daquele dá-se substancialmente, abre-se para amar, para fortificar, para santificar.
No altar o sacerdote de Jesus tem em suas mãos consagradas o Corpo e o Coração do Filho de Deus, e no santo cálice contempla e bebe o mesmo Sangue que, vertendo do Sagrado Coração, vivificava a carne do Verbo humanado. E como a Eucaristia é por excelência o mistério de amor, pode-se dizer que o sacerdote católico é verdadeiramente o consagrante, o depositário e o dispensador do Sagrado Coração de Jesus.
Quando comunga na santa missa, recebe em seu interior este divino Coração e este Sangue adorável. Recebe-o, e também nós o recebemos quando comungamos, com todas as suas chamas, com todos os seus ardores. Foco vivíssimo do amor é a Comunhão onde se come e bebe o Amor eterno, Jesus Cristo, sua carne, seu Coração e seu Sangue gloriosos!
O que o amor de nosso Salvador faz no mistério da Eucaristia apresenta um tal cúmulo de prodígios, que em vez de falar deles, sente-se inclinado, por respeito, a calar e adorar. Tudo o que disto se pode dizer é nada.
São Bernardo chama a este grande sacramento “o amor dos amores, amor amorum.” Certamente, o amor, só o amor impulsiona Nosso Senhor a encerrar-se sob essa humilde aparência, despojado de todo esplendor, e morar assim nesta terra de misérias, de lodo e de impurezas, exposto a mil e mil ultrajes, e isso há dezenove séculos, e até o fim dos tempos, até o seu segundo advento.
O amor é o que obriga Jesus a viver entre nós para nos cobrir aos olhos de seu Pai celestial, como a galinha cobre e protege com suas asas os seus pintainhos. Ali, sobre o altar, seu divino coração, suprindo a fraqueza de sua Igreja militante, faz subir incessantemente ao céu adorações, louvores, ações de graças, súplicas e orações dignas da majestade divina. “Sempre vivo para interceder por nós”,[1] ama por nós e nos obtém graças. Abençoa-nos com incessantes bênçãos, segundo a bela expressão de São Pedro: “Deus enviou o seu Filho para vos abençoar”.[2]
O amor, sim, o amor lhe fez resumir no Santíssimo Sacramento todos os seus mistérios de misericórdia e ternura,[3] pois ali está, sob os véus eucarísticos, como Criador e Senhor eterno dos Anjos e dos homens, do céu e da terra, santificador de todos os escolhidos, Santo dos Santos, Cabeça e Soberano pontífice da Igreja, Rei dos Patriarcas e Profetas, Salvador e Redentor. Ali está com a graça do mistério da Encarnação, com seu amplo sacrifício de trinta e três anos, com todas as suas palavras e todos os seus milagres; ali com tudo o que operou na santa alma de sua Mãe, em sua Igreja e em todos os seus eleitos; ali, enfim, com todo o mundo da graça e todo o mundo da glória, de que é princípio, centro e vida. Que oceano de amor encerra a Eucaristia!
E todo este mistério dos mistérios, este Amor dos amores, não é, no fundo, outra coisa que o vosso Sagrado Coração, oh, dulcíssimo Jesus! E nós, ingratos, correspondemos a este prodígio de bondade esquecendo-O no silêncio de seus Tabernáculos, e mostrando-nos mais frios para com Ele, mais endurecidos, e mais insensíveis que o mármore dos altares!
Notas
[1] “Semper vivens ad interpellandum pro nobis”. (Hb. VII, 25.)
[2] “Deue suscitans Filium suum, misit eum benedicentem vobis”. (Act. III, 26.)
[3] “Memoriam fecit mirabilium suorum misericors et miserator Dominus; escam dedit timentibus se.” (P s. C X .)
(*) Monsenhor de Ségur. El Sagrado Corazon de Jesus. pp. 125-129. Casa Editorial de Manuel Galindo y Bezares. 1888.

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